sexta-feira, 21 de março de 2014

Água de beber, camará

Depois de tudo que já li, confesso que algumas vezes apavorado, afinal parece que política revoga até as leis da física, concluí que já estamos sofrendo um racionamento. Me parece bastante claro que o fato de estarmos com todas as térmicas acionadas configura um racionamento de água. Ou seja, despacharam-se todas as térmicas para que sirvam ao seu propósito: garantir que os reservatórios sejam preservados. É fato que algumas térmicas operam na base. Poucas, mas estão lá, ajudando a preservar o (hoje nem tão seguro) nível dos reservatórios.

Mas estamos nos esquecendo de um fato importante e que afeta drasticamente o cenário energético. As térmicas também usam água. - Hã?! Como assim!? - Pois é. Com exceção daquelas que operam com turbinas a gás em ciclo aberto e aquelas que operam com motores alternativos (estes também precisam de um pouquinho de água), as demais precisam de bastante água para gerar vapor e para as torres de resfriamento. Muitas destas usinas captam água dos rios cercanos para repor estes circuitos. E não estamos falando de pouca coisa.

Uma termelétrica de ciclo combinado retira de sua fonte, que pode ser um rio, um lago, ou do mar, uma média de 957 litros d'água para cada MW-h gerado, uma usina a carvão já consome uma média de 3.800 litros d'água para cada MW-h gerado. Ou seja, uma térmica de 100 MW vai consumir 2.296.800 litros por dia da sua fonte de água, se for um ciclo combinado, e 9.130.000 litros, se for uma usina a carvão. Uma usina a biomassa (bagaço de cana, por exemplo) vai consumir 1.595.000 litros médios em um dia - considerei aqui uma usina menor, de 20 MW, por ser representativa deste tipo de empreendimento.

Embora as usinas a biomassa sejam menores, elas representam 8,96% da potência instalada, segundo o BIG, Banco de Informações de Geração da ANEEL. Ainda segundo o BIG, somando-se biomassa, carvão e gás natural, chegamos a 22,8%. É um número que não pode deixar de existir neste momento.

Ou seja, o que já é ruim pode vir a piorar,  pois a seca tem sido democrática, atacando rios grandes, médios e pequenos, e nossas grandes térmicas se servem destes rios.

Estes dados foram tirados de dois relatórios, um do NREL, National Renewable Energy Laboratory, e do EW3, Energy and Water in a Warming World Initiative. O primeiro relatório você pode baixar clicando aqui e o segundo aqui. São dados válidos para os EUA, mas não estamos muito distantes disto.

quinta-feira, 13 de março de 2014

Apaguinho, apagão!

As discussões sobre quase tudo que leio por aí não tem caráter técnico. Têm caráter financeiro. Dá para entender, afinal é sabido que o dinheiro move o mundo. Vem sendo assim desde que começamos a vender/comprar, no começo, ainda sem o vil metal, na base do escambo.
Por causa da profissão, sempre me perguntam quanto custa a energia disto ou daquilo, quase nunca, quase nunca mesmo, me perguntam se é possível fazer funcionar. Parece que qualquer coisa que receba dinheiro vira realidade, e a única questão é se dá dinheiro ou não.
Uma das raízes de nossa atual situação energética talvez seja a mentalidade voltada para (somente) a viabilidade econômica. Muitas vezes, os números, leia-se as quantias, são levados a masmorra, torturados, e saem somente quando dizem aquilo que o "empreendedor" quer ouvir, e o que ele quer ouvir é que a coisa é viável, que a taxa de retorno é altíssima e que o investimento se paga rapidamente.
Neste sentido, temos diversos investidores "profissionais". São aqueles que montam o empreendimento "viável" e depois correm atrás de executivos ávidos por mostrar aos acionistas que fizeram um negócio das Arábias.
Algumas das usinas que não saíram do papel têm o jeitão de terem sido pensadas para arrecadar dinheiro. As cifras são altíssimas, ganhos espetaculares, mas quando a coisa vem para a realidade técnica, não se consegue executar. O site não tem combustível. Os motores ou turbinas não alcançam a potência esperada, nem a eficiência. Ou até mesmo não há capacidade de fornecimento de equipamentos tão complexos em tão pouco tempo. As linhas de transmissão não existem (?). Acabamos ficando sem energia.
O bom projeto, para o país e para o investidor, é aquele em que nós recebemos a energia, de verdade, e o investidor recebe o retorno do investimento, também de verdade.